A HORA DO CONTO

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Vou-vos contar uma estória:

Era uma vez (ou não é assim que todas as estórias começam?) um casal meu vizinho com quem eu não tinha contacto algum para além do rotineiro "bom-dia" que resolveu tocar-me à porta, eram p'raí 7 e pico, 8 e coisa, 9 e tal. Vinham fazer uma demonstração de um "robô", se eu não me importasse, e trólóló conversa fiada de quem quer vender qualquer coisa. E eu "pois que sim", sem tencionar, à partida, comprar o que quer que fosse.

Saíu-me na rifa um aspirador, daqueles que nos sugam o tutano se preciso for (dos que têm o filtro de água).

Demonstraram, demonstraram... fiquei a saber quais eram as casas mais porcas da rua toda... que os desgraçados ainda não tinham conseguido vender um único sugador que fosse... que quem vendia tinha direito a tocar um sininho nas reuniões semanais... (e eu lembrei-me logo do elefante do jardim zoológico!)... enfim... uma grande e larga tanga!

Vinham munidos de uns dossiês que passaram seguidamente a folhear, à procura daquilo que eu julgava ser o preço do instrumento, Não, não era! Para meu espanto, sacaram-me de uma folha formato A4 com uma coisa em forma de assim! ERA UM ÁCARO! E eu pasmava cada vez mais! Nunca tinha visto o desenho de um ácaro quanto mais daquilo! Aquilo era o elefante do jardim zoológico sem tirar nem pôr! Fiquei sem pinga de sangue: mas eu convivia todas as noites com uma infinidade de monstros daqueles na minha cama? Estava quase a comprar o instrumento... Até que, finalmente, lá vieram os números... ao certo já me não lembro, ainda era os escudos reinantes, mas ultrapassava os trezentos contos... Arre punhais que aquela merda era demais! Foi como se tivese levado um safanão, acordei para a realidade: não tinha eu convivido com os bichos desde que nascera? Não estava eu ali? Era sinal que não me tinham arrancado ainda nenhuma perna nem nenhum braço! Vinham agora aqueles dois comer-me os olhos da cara!

"Que não! O meu orçamento não dava para tanto!" E eles " e porque já não tocavam o sino outra vez!" "Pagar a prestações? Nem pensar!" No meio de um miúdo choradinho lá se tiveram de conformar: iam ganhar apenas o que uma demonstração lhes dava, mediante uma assinatura minha num papel que serviria de comprovativo na reunião seguinte onde, mais uma vez, não fariam soar alguma glória... Saíram cabisbaixos, pedindo que eu lhes desse o contacto de pessoas minhas conhecidas para poderem demonstrar-lhes o sugador de monstros.

Vem isto a propósito de quê? Nada mais simples: pior que a bicharada só a outra bicharada a quem nós estamos entregues...

Por isso não me levem a mal quando eu brinco e gracejo... Os ácaros existem? Claro que sim! Mas nós convivemos com eles num grande bacanal todas as noites! O vírus H1N1 existe? Claro que sim, a bicharada a quem nós estamos entregues não o criou?... Estamos aqui para o que der e vier! Mas não nos atormentem a alma e sobretudo não toquem o sino muito alto para não nos acordarem no meio do sono!